08 agosto, 2007

das cotas na UFRGS

Pra começar, a opinião de quase todas as pessoas sobre as cotas depende somente da sua vida e de seus próprios interesses. O que importa nas cotas é elas trarão vantagem ou desvantagem, se fica mais fácil ou mais difícil pra entrar, pra si mesmo, para os filhos, os irmãos, os cônjuges, os amigos, para os avós, sei lá. Praticamente é somente isso que ouço, de pessoas infelizes porque as cotas diminuiriam suas chances de ingressar no tão sonhado ensino superior. E como sou alguém que só convive com a vaca, digo, com a nata (não é sério) da sociedade, essa é a reclamação mais comum. (Comer se faz sem muito alvoroço, geralmente. Aproveitar brechas não precisa ser comentado por quem é favorecido. A não ser entre seus pares, e não sou par de ninguém.)
Então, acho que ninguém tem pose para falar. Tampouco têm base para poder falar os reitores, ou as cabeças mais pensantes (gerencial e administrativamente falando) da universidade, que promovem qualquer ato que aprovam. "Agora que já se decidiu, deve ser o certo" é o pensamento. Afinal, pensar e repensar na mesma coisa (alguma conexão com outro post?) pode dar a impressão de dúvidas, e isso é algo que não se pode de forma nenhuma mostrar aos outros. (Isso é causa de muitas coisas idiotas que ocorrem, decisões internacionais, mas isso pode ficar para outra hora.) E também os universitários (da UFRGS) não devem ter muita competência para tocar no assunto; afinal, já estão "lá" (é comum fazer isso).
E por isso não se pode falar? (Alguma música associada?) Bem, acho que o silêncio só interessa aos mudos e aos não-veiculadores de palavras.

Então falaremos.
Pra começar esta segunda parte, não sei se é tão injusto que se discriminem os alunos que passem através de cotas. Porque eles acabaram discriminados no processo de vestibular. Até na universidade devem ser discriminados pela forma como entraram (não creio que isso será apagado). Daí se poderia invocar isso a qualquer momento, e não sei se isso é ilegal.
Uma coisa diferente: acho que até poderia haver um apoio para estudantes carentes, agora favorecer raças me é absurdo. A menos que se assuma que se os negros sejam intelectualmente inferiores (mas mesmo que alguém falasse isso, esquecendo do preconceito e da discriminação), só por isso eles teriam mais direito de entrar na universidade? E se o motivo for porque negros, devido ao período de escravidão, se encontram em camadas mais pobres e proporcionalmente estudam mais em escolas públicas, então a solução não passa por um tratamento aos negros, e talvez por uma ajuda a quem veio de uma camada mais pobre ou estudou em escola pública. Baita racismo ajudar uma raça.
Agora, outra dúvida: se uma pessoa é desfavorecida por algum motivo, então deve-se facilitar o seu acesso à universidade? Aqui devemos lembrar que se alguém ingressa, alguém é privado de fazer o mesmo. (Ou seja, não se pode falar aqui nas rampas para deficientes físicos. Estamos falando de vagas na universidade pública.) Acho que isso não é necessariamente verdadeiro. (Sei que meus passos não são suficientes lógicos para conduzir a uma demonstração por absurdo.) Se fosse assim, que toda dificuldade imposta tivesse de ser recompensada, talvez se considerasse justo um auxílio para pessoas que são órfãs de pai ou mãe, pois sofreram privações (basicamente de caráter emocional) que podem tê-las prejudicado. Talvez também fosse justo que fosse dado a pessoas obesas, que sofrem preconceito também (e que é bem menos condenado que o racismo) e podem ter dificuldades em arranjar um emprego. Pessoas que quando crianças tiveram um presente de Natal negado poderiam ter ficado traumatizadas, e por esse risco (talvez não seja só um risco, talvez todo episódio principalmente quando somos mais novos tenha grande influência na pessoa que se forma e desabrocha) talvez mereceriam também uma compensação? Bem, acho que essas dificuldades são difíceis de serem comprovadas ou negadas (nem me passa na cabeça se são impossíveis ou não [acho que aqui não importa]). Agora, só por causa de uma dificuldade deve-se agregar a ela um contrapeso favorável para tentar manter um equilíbrio? Acho que a pergunta não tem muito sentido porque não foi adequado usar "equilíbrio" numa pergunta assim sobre coisas que não temos a mínima idéia do que são (é, sabemos pouquíssimo. E o conhecimento acaba? Discutiremos isso outra vez...). Acho que não necessariamente. Mas há um motivo mais forte: favorecendo alunos de escolas públicas também se favorecem alunos de escolas militares que comumente têm um ensino melhor que os colégios particulares. Deixando-se as escolas militares nesse conjunto favorecido é criada uma vantagem enorme para alunos delas. Ninguém pensa em excluí-las, claro, seria algo muito preconceituoso (é mais fácil dar muito a alguns que se assumir que para isso se tira pouco de muitos). E se fosse exclui-las, quais seriam as escolas públicas que deveriam ser tratadas como quais? Se houvesse um critério haveria escolas tentando colocar-se logo abaixo desse critério, tentando reduzir, mas só um pouco!, a qualidade do ensino (bom, um cenário bem improvável). Mas mesmo assim, acho que tenderíamos a uma classificação que a burocracia não deixaria existir. Este é um furo razoavelmente largo. E sem desculpas do tipo de quem estudantes de colégios militares entram de qualquer forma. Se crêem realmente nisso, então extingüam o vestibular a eles a fim de cortar um pouco de gastos e deixem-nos entrar livremente.
Outro ponto: talvez nem fosse tão saudável baixar um pouco o nível dos alunos; isso poderia comprometer a qualidade do ensino. Mas, sendo irônico, isso nada importa aos governos. Aliás, tanto melhor. Mesmo assim, há pontos bem mais críticos e furos bem mais embaixo, de forma que não acho necessário lembrar que usar alunos menos capacitados pra entrar (afinal, haveria gente com melhor desempenho no vestibular) poderiam atrapalhar um pouco os outros. Não afirmo que seria muito drástico, muito menos que seria praticamente nulo: ainda não consigo mensurar as influências num ambiente assim.
Talvez fosse justo, sim, reduzir o preço da inscrição para o vestibular para certos alunos (mas não por distinção de raça!). Acho que renda seria o melhor critério. E também pode ser justo ajudar o estudo de alunos mais pobres com moradia ou auxílios-carências (acho que as duas palavras flexionam para o plural...).

(Falei da UFRGS [Univeridade Federal do Rio Grande do Sul, para os estranhos], mas deve valer também para cotas de outras universidades que adotem sistema semelhante.)

(No fim apresento-me, tentando evitar enganos de quem lê durante a leitura: sou um estudante de Matemática na UFRGS.)

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